domingo, 22 de junho de 2008

Uma experiência para esquecer

O dia amanheceu nublado e com um vento muito forte soprando. Decidimos dar uma voltinha de carro com os cachorros para explorar novos caminhos. Seguimos em direção a Owendo. Mas a certa altura Gunther disse que seria melhor se virássemos à esqueda, pois se seguíssemos em frente não conseguiríamos ir muito longe. Uns 200 metros após lá estavam eles, os policiais gaboneses. É claro que eles nos pararam. Todos os documentos exibidos, incluindo meu passaporte, carte se jour de Gunther... Só que tinha algo "errado"... Aqui, como no Brasil, a licença do carro precisa ser renovada anualmente. Para isso tem que ser exibido junto ao órgão competente um documento que é quase como um green card, na verdade é o gris carte que comprova a origem e a regularidade do veículo. A partir daí é expedido um outro documento (um cartão de pvc) que diz que aquele veículo está inspecionado e com os documentos em dia. Só que desta vez, como em nenhuma outra, o guarda pediu este "gris carte", que lhe foi apresentado, mas não o original, apenas uma cópia. Aí começou o problema. Não poderíamos seguir com o veículo com esta "irregularidade", afinal a cópia não estava autenticada. Foi-lhe explicado de que o original havia sido apresentado aos responsáveis pela expedição do cartão de inspeção anual, mas não teve jeito. $ 12.000 CFA esse era o preço para liberarem o veículo. Como adotamos a prática do "não temos dinheiro", o preço caiu um pouco - $ 5.000 CFA. Para falar a verdade nós realmente não tínhamos dinheiro - pelo menos não tínhamos CFA conosco. Então o executor da lei, além do chefe e mais um, decidiram que o veículo e meus documentos seriam apreendidos. Concordamos. De pronto Gunther ligou para a DHL e pediu que o motorista viesse nos buscar. Acho que eles não acreditavam que estávamos falando sério sobre deixar o carro com eles, pois de vez em quando um deles vinha para nos explicar mais alguma coisa. Quase uma hora depois de termos sido parados, fomos avisados de que deveríamos seguir o carro da polícia até a brigada - na verdade um carro particular dirigido por uma pessoa que pelo visto não era da polícia. Assim que saímos, chegou a van da DHL, que nos seguiu. Dentro estavam o motorista e o irmão dele, que também trabalha para a polícia mas estava de folga. Depois de rodarmos um bocado, vimos a brigada, só que ao invés de pararmos, seguimos adiante. Isso começou a nos intrigar. Estávamos cada vez mais nos afastando da área urbana. Não havia mais asfalto, apenas uma estrada de barro esburacada. Depois de diversas paradas, inclusive uma para fazer mais uma vítima que seguiu conosco, chegamos ao nosso destino: uma barraca no meio do mato. Antes de recomeçarmos as negociações, o irmão do motorista da DHL nos informou que a situação havia se "complicado", que seria melhor que pagássemos os $ 5.000 CFA que eles queriam. Mas a esta altura, a nossa decisão era de realmente não pagar nada. Quando Gunther começou a conversar com eles o preço mudou para $ 50.000 CFA. Tudo bem, dissemos, pagamos com cheque, mas precisamos de um recibo da infração para o ressarcimento, afinal o veículo é da empresa. Depois de muita conversa e ingestão, por parte deles, de uma bebida que eles chamam de vinho de palma (um tipo de cachaça preparada artesanalmente), fomos liberados sem pagar nenhum tostão. Eu colocaria aqui esta situação como mais uma experiência com a polícia gabonesa. Só que esta é uma que eu realmente prefiro esquecer. Tenho vergonha por eles. Nós não perdemos nada além do nosso tempo nessa história, mas eles perderam a dignidade (se é que eles ainda tinham alguma). Voltamos para casa, fizemos nosso churrasco, bebemos um bom vinho e eles estão lá bebendo um tipo de cachaça que, se não preparada adequadamente, pode até cegar. Ou então estão na estrada novamente esperando uma nova vítima, de preferência algum estrangeiro que esteja disposto a pagar qualquer coisa para se ver livre deles. Sinto vergonha por eles. Sinto vergonha pelo povo gabonês.

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